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Os dois mosqueteiros

- 01/12/2005

No distrito de Carrapicho ninguém era mais valente do que o Chalão de Nena: conversou, não explicou, pau can­tou, no chão parou! Essa era a tradição na bodega de Zeca, todo sábado de feira. Num sábado de santo importante, com missa de estola azul, o coronel Epaminondas levou seu bode velho, Mosqueteiro, para um churrasco entre amigos e logo recebeu a indicação:
- Ninguém é melhor para estripança de bode que o Chalão de Nena.
Foi assim que o coronel emprestou sua peixeira reluzente para Chalão, com a recomendação:
- Pois, capriche, homem, esnobe sua sabença.
O bode, porém, era velho, cara de sabido, de carne dura, e alguém atalhou:
- Xiii, pra amaciar esse bode é preciso umas três garrafas de cana.
Todos concordaram e lá foi Chalão com a peixeira e três garrafas com cachaça da boa, para embriagar o bode e assim amaciar aquela carne de muitos anos passados. O relógio da igreja mostrava oito horas.
Lá pelas 11:00 o estômago do coronel fez o primeiro rom-rom, e numa sonora talagada, lembrou:
- Cadê a costela de bode torrado?
Alguém foi ver o serviço de Chalão e voltou com a notícia: o bode era graúdo, não era tarefa fácil, mas logo estaria chegando. A conversa seguiu o ritmo bodeguês, observando quem ia e quem vinha pela feira.
Passou do meio-dia, chegou 13:00 da tarde, a cachaça esquentava o juízo. No comes-e-bebes do coronel só tinha bebes e nada de comes. Quando o sol começou a amornar, lá pelas 15:00, a turma já de cara-vermelha pelo porre foi procurar o bode:
- Cadê a carne, a costelinha, o pititico, o sarapatel?
Chegaram ao fundo do quintal e gelaram como estátuas de praça. Sentado no chão, num porre de fazer gosto, com três garrafas esparramadas, Zequinha abraçado ao bode com olhos esfumaçados de bicho-doidão, trançava uma conversa de ex-casos de amor. A turma foi se chegando e logo ouvindo:
- Ora, ora, Mosque, aqui na região não tem homem pra fazer mal pra você. Você era bom com as cabritas, mas o tempo passa pra todos nós e, agora, eu e você vivemos de lembrança e valentia. Ic! Pode crer, aqui está um amigo de verdade, escudeiro de boa fé. Depois das coisas que você me contou nós vamos ser amigos pro resto da vida.
Era um porre duplo, no sol derretedor de juízo, com cheiro de cachaça misturado a cheiro de bode. Legítima inhaca diurna.
Vendo a turma se achegando, Cha­lão arregalou os olhos e entendeu que era um exército do Cão querendo fazer mal a seu amigão, que também se aprumava para enfrentar uma briga. Chalão vislumbrou guerra-grande, pegou a peixeira brilhosa, brandiu no ar, mal se equilibrando nas pernas, ribombando:
- Tá bom, tá bom. Se é pra ser agora, que seja. Vai ter defunto espalhado por aqui. Pode vir vinte ou cinquenta, mas Mosque ainda tem muitos segredos e está contando tudinho para mim. Ninguém se achegue, não.
A peixeira no ar explicava tudo: ali estavam, não um, mas dois mosqueteiros dispostos a tudo.
A turma estancou. Chalão estava doidinho da silva, disposto a tudo. Era um mosqueteiro-do-rei, de fato!
- Pois comece a matruzalha! Quem vai ser o primeiro macho a lamber o chão?
A turma olhou, olhou, viu que os dois mosqueteiros estavam dispostos a defender a pele espalhando tripas pra todo lado.
O coronel coçou o cavanhaque, si­nal de que a já tão tardia comilança po­dia esperar outro dia. O jeito foi procurar uma costela de bode alheio, no botequim do outro lado da praça, enquanto os dois mosqueteiros continuaram a longa conversa, pela tarde e, depois, pela noite adentro, naquele país longínquo confinado atrás do muro.
 
Publicado Be 85





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